Empresas do Ceará podem perder quase R$ 1 bilhão em exportações de aço com nova tarifa de Trump; entenda

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País norte-americano é o principal destino dos produtos siderúrgicos produzidos no Estado; cenário aponta para prejuízos consideráveis

Pela segunda vez neste ano, o presidente dos Estados UnidosDonald Trump, anunciou que os produtos brasileiros vão ser taxados. No chamado “tarifaço” do “Dia da Libertação”, como definido pelo mandatário estadunidense, as mercadorias do Brasil vão pagar mais 10% em impostos para entrarem no território norte-americano. Para produtos como aço e alumínio, isso representa uma segunda tributação, e com cenário desfavorável ao Ceará.

A medida veio menos de dois meses após o próprio Donald Trump anunciar a taxação de 25% para o aço e o alumínio importado pelos Estados Unidos de demais países, uma decisão que afetou diretamente o território cearense. Os materiais são os principais responsáveis pelas exportações do Ceará, produzidos em sua maioria na região do Complexo Industrial e Portuário do Pecém (Cipp).

Somente em 2024, o aço foi fundamental para as exportações cearenses, correspondendo a 38% de tudo o que foi comercializado pelo Estado com o exterior. Desse percentual, cerca de 80% foi para os Estados Unidos.

Em termos financeiros, o Ceará exportou US$ 545 milhões (R$ 3,1 bilhões na cotação atual), sendo US$ 438 milhões para os EUA (R$ 2,5 bilhões em conversão para a moeda brasileira). Para efeitos comparativos, o Produto Interno Bruto (PIB) do Estado de 2024 foi de R$ 214,6 bilhões. Somente as exportações cearenses para o território estadunidense no ano passado representaram 1,2% do PIB estadual.

Segundo promessa de Donald Trump, as novas taxações, que incluem pelo menos outros 20 países, entraram em vigor à meia-noite desta quinta-feira (3). O jornal estadunidense The New York Times aponta que o presidente dos EUA quer estabelecer uma taxa básica universal de 10% para todos os países que negociarem com o território norte-americano, e que nações como China — atual maior parceiro comercial do Brasil — deverão ser os mais afetados.

Ceará já vem em cenário de exportação desfavorável

Conforme dados do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece), a balança comercial do Estado no que diz respeito às exportações já vem sofrendo uma queda acentuada no pós-pandemia.

Em 2024, as vendas para o exterior de ferro fundido, ferro e aço tiveram queda de quase 50% na comparação com o ano anterior. Antes, os produtos eram responsáveis por mais da metade de tudo o que era exportado pelo Estado. Apesar de ainda manterem a liderança, a queda na participação fez com que os itens correspondessem a menos de 40% das exportações cearenses.

Para o mestre em Economia e integrante do Conselho Regional de Economia Ceará (Corecon-CE), Eldair Melo, com a taxação anterior de 25%, as exportações do aço e do alumínio cearense já deveriam diminuir em pelo menos 20%, ou US$ 107 milhões (cerca de R$ 610 milhões na cotação atual), mas com os novos 10% anunciados por Trump, a tendência é um prejuízo ainda maior, pendente ainda de negociações entre o Governo Federal e os EUA.

Ainda não está definida se essa taxação vai baixar ou vai ser incorporada a que já existe, vamos aguardar mais detalhes sobre isso. (…) Isso vai resultar em impactos adversos no setor siderúrgico do estado.Eldair Melo

Mestre em economia e integrante do Corecon-CE

Presidente Donald Trump segura uma tabela com uma lista de países, incluindo o Brasil, que serão afetados por tarifas aplicadas como medidas econômicas
Legenda: Nos jardins da Casa Branca, Donald Trump disse que o anúnio era a volta da “era de ouro” da AméricaFoto: Brendan Smialowski / AFP

O economista Alex Araújo é categórico ao dizer que a nova taxação será, de fato, prejudicial para a balança comercial cearense, e que é preciso que o governo estadual diversifique a pauta da exportação para evitar ainda mais prejuízos.

“O aço representa uma fatia significativa das exportações cearense. Diante disso, o governo e as empresas precisarão ampliar as negociações com os Estados Unidos para buscar alternativas à cobrança direta de tarifas, enquanto diversificam os mercados de destino. Setores como o agronegócio, produtos manufaturados e amêndoas podem ganhar espaço e ajudar a compensar as perdas causadas pelo impacto no aço”, considera.

Apesar de tarifas altas, efeitos serão mais perceptíveis no curto prazo, dizem especialistas

As taxas anunciadas por Trump são significativas para o setor siderúrgico cearense, na opinião dos especialistas ouvidos pelo Diário do Nordeste. Segundo eles, isso mostra que o presidente dos EUA está preocupado em reorganizar a capacidade produtiva do país e atrair investimentos industriais para o território estadunidense.

Como a taxação não foi exclusiva para o Brasil — afetado com 10% neste ‘tarifaço’ — e afetou principalmente nações como a China, maior concorrente brasileira no comércio exterior de aço, Eldair Melo acredita que as siderúrgicas nacionais devem ter um “ganho relativo” com os novos tributos.

“Como essa taxação está acontecendo em todos os países e como a China, concorrente brasileira para o mercado americano e o Brasil exporta especialmente aço para os EUA, as empresas brasileiras vão ter uma competitividade relativa em relação ao aço chinês, porque está com a tarifa mais alta do que a brasileira”, expõe.

O economista Alex Araújo defende que, inicialmente, os preços dos produtos brasileiros, em especial os siderúrgicos cearenses, deverão, pelo menos em um primeiro momento, ficar menos competitivos nos EUA, mas com o passar do tempo e a abertura de novos mercados, a tendência é de uma readequação no segmento.

“O novo acréscimo torna os preços menos competitivos no mercado americano, e a baixa margem de lucratividade típica da siderurgia torna inviável absorver esses custos sem os repassar ao consumidor. Dessa forma, é provável que as empresas precisem buscar outros mercados para distribuir seus produtos e minimizar os impactos. No entanto, esses efeitos devem ser mais pronunciados no curto prazo, enquanto as empresas se adaptam à nova realidade tarifária”, argumenta.

Para evitar a dependência de mercados exteriores e políticas nacionais que mudam conforme o entendimento dos governantes, Eldair Melo aponta que o Ceará deve apostar em produtos siderúrgicos mais manufaturados, que apresentem valor agregado maior, além de o Estado mirar em outros países fora do eixo tradicional de exportação.

“É crucial diversificar os mercados de destino buscando parceiros comerciais além dos EUA. Além disso, investir na agregação de valores dos produtos exportados com o desenvolvimento de produtos siderúrgicos de maior valor agregado pode aumentar a competitividade do mercado internacional. Setores como calçados, têxtil e fruticultura que já possui presença do mercado externo podem ser fortalecidos e ampliados como estratégia de diversificação da pauta exportadora cearense”, enfatiza.

Diário do Nordeste entrou em contato com a ArcelorMittal, empresa responsável pela siderúrgica instalada no Cipp. Ela disse que o posicionamento seria dado por meio do Instituto Aço Brasil, entidade de classe que representa as indústrias brasileiras produtoras de aço.

Até a publicação desta matéria, no entanto, não havia nenhum retorno sobre os questionamentos acerca da nova taxação dos EUA. O mesmo ocorreu com as solicitações realizadas à Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec).

Diário do Nordeste 

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