O Congresso Nacional aprovou nesta quarta-feira (16) o programa Mais Médicos, lançado em julho pelo Palácio do Planalto com o objetivo de aumentar a presença desses profissionais em municípios do interior e em periferias de grandes cidades. Criado em meio a forte polêmica, o programa se tornou a principal bandeira eleitoral da presidente Dilma Rousseff à reeleição.
Após uma votação tumultuada na Câmara, que se prolongou por dois dias, o texto da medida provisória foi aprovado sem grandes sobressaltos pelos senadores. Não houve nenhuma mudança em relação ao texto aprovado pelos deputados, apenas ajustes na redação. Com isso, ele segue direto para a sanção presidencial.
Um dos pontos mais criticados por entidades médicas e congressistas ao longo da tramitação é a possibilidade de atuação no Brasil, ainda que em período limitado e em local específico, de médicos formados no exterior sem o diploma revalidado. A vinda expressiva de médicos de Cuba (já são 2.400 no país) também gerou reações ao programa.
A menos de um ano das eleições, a intenção do governo agora é acelerar a implantação do programa. Um dos entraves até aqui foi o atraso na emissão dos registros dos profissionais formados no exterior, atribuição originalmente dos conselhos regionais de medicina.
De um lado, o governo argumentou que a demora além do prazo previsto, de 15 dias, era proposital. De outro, as entidades alegavam que o governo se recusava a entregar documentos solicitados por elas. Dos 656 pedidos de registro protocolados, 196 ainda não foram emitidos.
Ao todo, entre médicos formados no Brasil e no exterior, 1.061 profissionais já estão atuando em postos de saúde no país, a maior parte deles nas regiões norte e nordeste.
Governo retirou trecho do texto que enfrentava resistências do CFM
Para garantir a aprovação da medida provisória no Congresso, o governo entrou em campo e retirou trecho do texto que enfrentava resistências do Conselho Federal de Medicina (CFM) e de alguns congressistas, como aquele que criava um fórum consultivo no âmbito do governo federal para questões de saúde. Para os críticos, essa instância enfraqueceria atribuições que são dos conselhos regionais e federal.
O governo também sinalizou aos congressistas, em troca da aprovação do Mais Médicos, mudança no projeto do orçamento impositivo para ampliar de 1% para 1,3% o valor dos recursos que serão destinados obrigatoriamente ao pagamento das emendas individuais dos deputados e senadores.
Com a mudança acatada pelos congressistas – e negociada com o Conselho Federal de Medicina – caberá ao Ministério da Saúde a emissão do “registro único” dos médicos intercambistas. A alteração vai agilizar a entrega do documento e o envio desses profissionais ao local de trabalho.
O senador Agripino Maia (DEM-RN), um dos líderes da oposição, chegou a apresentar emenda para retirar o trecho do texto que deu à pasta da Saúde esse poder, mas foi derrotado em votação no plenário.
Adversários de Dilma em 2014, DEM e PSDB criticaram o programa, mas não foram contrários à sua aprovação. “Não queremos médicos desqualificados, mas bons médicos. Ninguém tem melhores condições de aferir do que aqueles que o fazem há mais de 60 anos, que são os conselhos de medicina”, disse o líder do PSDB, Aloysio Nunes Ferreira (SP).
Ao todo, prefeitos de 4.025 municípios e 35 distritos indígenas solicitaram 16.625 médicos. Se somados os brasileiros que se apresentaram até aqui e os estrangeiros que já receberam o registro, apenas 22% dessa demanda foi atendida.
Médicos intercambistas deverão passar pelo Revalida
O texto aprovado define que, após três anos de atuação no país, os médicos intercambistas deverão passar pelo Revalida caso queiram continuar em território nacional. Antes, o prazo original era de seis anos.
O exame federal registra, desde sua criação, percentuais muito baixos de aprovação. A edição deste ano ainda não teve seu resultado divulgado. Como mostrou reportagem da Folha de S.Paulo publicada ontem, a divulgação foi adiada por duas vezes e ocorrerá apenas após a conclusão do debate do programa no Congresso Nacional.
O governo nega relação entre os adiamentos e o debate do texto no Legislativo.
Atenção básica é o foco
O foco em atenção básica permeia não apenas o programa como também a graduação de medicina. O currículo do curso foi alterado pela medida provisória: 30% dos dois anos de internato deverão ocorrer na atenção básica e em serviço de urgência e emergência do SUS.
Foi retirada, no entanto, a previsão de que o curso teria um tempo adicional de dois anos, saltando de seis para oito anos. O governo recuou desse ponto após críticas de especialistas.
Também houve mudanças no currículo de algumas residências: um grupo de seis especialidades, por exemplo, terá como pré-requisito a residência de um ano em medicina geral de família e comunidade. São elas: clínica médica, pediatria, ginecologia e obstetrícia, cirurgia geral, psiquiatria e medicina preventiva e social. O governo comprometeu-se ainda a universalizar, até 2018, as vagas em residência médica, há uma defasagem entre número de formandos e vagas em especialidades.
Oposição vota a favor do programa, mas fez duras críticas
A oposição, embora tenha votado a favor do programa, fez duras críticas à iniciativa, apontando interesse eleitoral no Mais Médicos. Líder do PSDB na Casa, o senador Aloysio Nunes (PSDB) afirmou que o programa foi lançado “às pressas, de qualquer maneira”.
“É uma medida eleitoreira, que se apresenta como a galinha dos ovos de ouro da campanha eleitoral da presidente Dilma. Uma medida engendrada na última hora para atender as manifestações de rua”, afirmou no plenário.
O presidente do DEM adotou discurso semelhante: “Vou votar a favor da medida provisória, mas não me venham com essa história de que o programa é a solução para os problemas de saúde do Brasil”.