As vítimas de picadas de cobras criticam a má distribuição do antídoto no interior do Estado que é fornecido apenas para os hospitais-polo do Ceará em razão da quantidade restrita de ampolas enviadas pelo Ministério da Saúde
Em um intervalo de apenas cinco dias, três pessoas morreram após terem sido picadas por cobras no Ceará. Além desses óbitos, 464 pessoas foram vítimas de serpentes até maio deste ano no Estado, conforme levantamento da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa). Para além dos números, o temor da população é devido à dificuldade de encontrar soro antiofídico. E foi justamente a ausência da substância utilizada para combater o veneno das serpentes que levou a óbito essas pessoas.
Delas, dois agricultores, um de Jaguaruana e o outro de Santa Quitéria, morreram após serem intoxicados pelo veneno desses répteis peçonhentos. Não havia soro antiofídico nos hospitais públicos dos dois municípios. Por isso, o paciente de Jaguaruana foi transferido para o Hospital Regional de Russas e o morador de Santa Quitéria para o Hospital Regional Norte, em Sobral. Ambos morreram dias depois.
A Sesa confirmou apenas este último óbito. A primeira morte, conforme a Pasta, não pôde ser relacionada à picada de cobra.
Soro
Embora os hospitais tenham confirmado a ausência dos soros antibotrópico e antiofídico, usados em casos de picada de cobras venenosas, a Sesa garantiu que o estoque no Ceará está regular. O repasse, ainda conforme a Secretaria, é feito mensalmente pelo Ministério da Saúde e distribuído semanalmente para as Coordenadorias Regionais de Saúde (Cres). No entanto, é liberado somente para os hospitais de referência. O antídoto é fornecido apenas para os hospitais-polo em razão da quantidade restrita de ampolas enviadas pelo Ministério. A reposição ocorre conforme a demanda de cada uma das cinco macrorregiões de saúde: Fortaleza, Sobral, Sertão Central, Litoral Leste/Jaguaribe e Cariri. Elas integram os 184 municípios cearenses.
Para a Sesa, essa logística objetiva a otimização dos imunobiológicos e evita o desabastecimento. Todavia, gestores de hospitais municipais criticam a estratégia da Secretaria Estadual. O diretor do Hospital Municipal de Santa Quitéria, Diego Timbó, cita como exemplo o seu Município. Há localidades distantes até 80 km da sede. Os pacientes correm contra o tempo e contra a morte. “O medicamento pode salvar vidas, mas é mantido apenas em hospitais-polo”, reclama.
“Estou elaborando um relatório e vou encaminhar à Sesa. É necessário rever essa política de distribuição do soro. Somos o maior Município em extensão territorial do Ceará, mas com certeza outros enfrentam o mesmo problema”, critica Timbó.
Apenas nove hospitais-polo atendem vítimas de acidente por serpentes no Ceará. Além do Instituto Dr. José Frota (Fortaleza), a Santa Casa de Sobral e Hospital Regional Norte (Sobral), o Hospital Regional do Cariri (Juazeiro do Norte), Hospital Municipal Dr. Eudásio Barroso (Quixadá), Hospital Regional e Maternidade Alberto Feitosa Lima (Tauá), Hospital Polo Dr. Eduardo Dias (Aracati), Hospital e Casa de Saúde de Russas e Hospital São Camilo (Limoeiro do Norte).
Agilidade
A médica coordenadora do Centro de Assistência Toxicológica (Ceatox) do Instituto Dr. José Frota (IJF), Poliana Lemos, confirma a necessidade de o paciente receber os cuidados médicos e o soro o mais rápido possível.
“A taxa de letalidade provocada pelas nossas serpentes está na faixa dos 3%. É ideal diagnosticar e realizar o atendimento antes de 4 horas”, ressalta a profissional. A demora pode acarretar em sérias complicações como hemorragia e problemas renais. Cerca de um terço dos pacientes pode necessitar de hemodiálise. Entre os médicos, é consenso que a rapidez no atendimento pode fazer a diferença entre a vida e a morte.
Casos
De acordo com a Sesa, em 2017 e 2018, houve 1.010 e 978 casos de picadas de serpentes, respectivamente, em todo o Ceará. Neste ano, até maio, já foram contabilizados pela Secretaria 464 vítimas dos répteis. Contudo, o órgão do Estado não informou a quantidade de mortes decorrentes dos venenos desses animais neste ano e nos dois anteriores.
DN